Os três veículos: uma visão não-sectária

Há três níveis de prática. Isso pode ser muito confuso, porque podemos acreditar que esses três níveis estão conectados a diferentes tipos de linhagem (e, portanto, achar que uma linhagem é superior a outra) ou então pensar que basta escolher em qual nível queremos estar (e quem é que não quer estar no nível mais elevado?)

Na verdade, precisamos ver com muita sinceridade o que nós queremos. O que mais ocupa a nossa mente é o constante desejo de controlar para ter sucesso no mundo, para que os outros gostem da gente e evitar que sejamos criticados. Essas são algumas das oito preocupações mundanas e a maioria de nós está profundamente envolvida com elas. Esse é o nosso maior inimigo.

Perceber isso sinceramente nos leva ao primeiro nível: Hinayana, ou o pequeno veículo. Isso significa desejar nossa própria liberação. Desejar a liberação de todo o coração é algo difícil. Afinal, o que é a liberação? Você já a experienciou alguma vez? Como é que ela é? Você realmente quer estar totalmente livre do seu ego? Experimente: tente ver o que a sua mente diz quando você tenta soltar tudo o que você sabe e o que você quer.

Nós temos que olhar o nosso sofrimento e aprender a acolhê-lo para realmente entender o que é que produz sofrimento. Conseguir abrir mão de querer ter sucesso nesse mundo é como um cachorro querendo comer grama. Ou seja, o primeiro veículo já é um estágio bastante avançado. Nós não devemos conectar a visão Hinayana (ou seja, o desejo de se liberar) com uma linhagem particular. O que os tibetanos normalmente chamam de “o veículo inferior” veio de uma antiga discussão na Índia (e que ainda é transmitido através de textos), para elucidar as consequências do praticante ter motivações pessoais. Mas o que o texto comenta sobre Hinayana não corresponde mais a nenhuma linhagem dos dias de hoje. É errôneo pensar que há linhagens em que os praticantes só pensam em si mesmos.

O segundo passo é o Mahayana: o grande veículo. Trata-se de compreender que não apenas nós, mas todos os seres têm a mesma natureza. Portanto, o praticante se esforça em sua prática espiritual não somente para si mesmo, mas para o benefĩcio de todos os seres. Praticar para os outros é ainda mais difícil. Não se trata de uma ideia bonitinha, mas um estado em que há uma preocupação real pelos outros. E não apenas uma vez ao dia, mas continuamente. Nós temos que ter um alto nível de realização para sinceramente desejar o bem de todos a todos os momentos.

O terceiro passo é Vajrayana, que é a plena confiança de que a natureza búdica não é uma semente que precisa ser plantada, mas sempre esteve aqui no seu potencial máximo. Nesse tipo de prática, nós tocamos diretamente as qualidades iluminadas inatas da mente. A prática Vajrayana é extremamente avançada: temos que ter verdadeira confiança nas qualidades iluminadas. Ela engloba os veículos anteriores: desejo sincero de se liberar do sofrimento sem o menor traço de dúvida; preocupar-se com os outros em todos os momentos; e saber que o estado natural da nossa mente é o estado búdico.

Eu não quero assustar ninguém ou desanimar a ousar a dar o primeiro passo. Não se preocupe, pois nossa mente muda o tempo todo. A maioria do tempo ela tem medo ou está preocupada com coisas mundanas. E de repente ela sente a certeza de que há algo a mais. Então nossa motivação brota.

Em outro momento, experienciamos o amor sincero e aprendemos que esse é o melhor estado mental em que podemos estar. Ele não está distante; só precisa ser cultivado corretamente.

Nossa mente vive distraída, mas nós podemos colocar nossa concentração no lugar certo. A partir daí, somos capazes de investigar e ter certeza do que realmente queremos.

Passo a passo, pouco a pouco, nosso caminho está livre para cultivarmos o amor e entendermos, através da experiência, que nosso estado natural é o estado búdico.

Mas tenha em mente que você não pode escolher onde você está; você pode apenas observar onde você está e do que sua prática precisa. Pergunte-se; permita-se ser guiado em como cultivar o que é necessário. Não importa a sua linhagem; apenas observe se você está cultivando a coisa certa. Nunca se torne um praticante antigo demais que não tem mais perguntas a fazer, ou que se apóia somente no tanto de meditação que já fez ou nos mestres que já conheceu.

Não precisa falar nada; apenas cultivar o que é correto.

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