“Os textos e muitos livros falam sobre “Meu Guru”, e que vocês precisam de um e provavelmente muitas pessoas estão olhando e se perguntando como eu acho “o meu Guru”? Isto é muito delicado. A dica mais importante é saber o que nós queremos. O que você quer?”
Link para download da gravação original: https://www.dropbox.com/s/ht77f28f5l92fq6/%232_podcast_Guru_1_Gelek.mp3?dl=0
Transcrição do podcast Guru
A questão aqui é sobre o Guru. Uma questão inspiradora e também difícil de abordar.
A questão do Guru é muito proeminente neste “supermercado” espiritual, neste mundo espiritual.
Acredito que cada um entenda a palavra Guru de formas diferentes.
Guru ou Lama devem ser mestres, mestres que chegaram ao fim do caminho, que tem uma realização estável, o quer dizer que na prática formal, eles sentem, soltam o apego e encontram um estado de consciência. Eles relaxam na não dualidade. Eles experimentam a liberdade e basicamente qualquer movimento.
Enfim, entre os Gurus provavelmente também existam hierarquias e alguns que desenvolveram maiores capacidades do que os outros. Mas, vamos deixar isto um pouco de lado, porque é muito difícil julgar o estado onde uma pessoa se encontra.
Enfim, falamos sobre pessoas que tem uma realização de algo que nós não conhecemos ainda ou talvez só em partes.
Os textos e muitos livros falam sobre “Meu Guru”, e que vocês precisam de um e provavelmente muitas pessoas estão olhando e se perguntando como eu acho “o meu Guru”?
Isto é muito delicado. A dica mais importante é saber o que nós queremos. O que você quer?
Segundo Dzongzar Khyentse, se um Guru não é plenamente realizado, quer dizer, quando falta realização, talvez, e provavelmente, sem querer, ele entra num papel, ele preenche um papel. Nas sociedades da Ásia, de onde vem o budismo, talvez isto seja muito comum. Lá tem muitos Gurus e para eles isto é um trabalho. Eles têm uma maneira de sentar, uma maneira de se vestir e todo mundo inclina-se, junta as mãos, tem muito ritual e tem muita formalidade em volta deles. Então, é muito fácil que os Gurus só conheçam este tipo de vida, este papel. Basicamente é um tipo de trabalho para eles.
Na sociedade tibetana, por exemplo, muitos Gurus buscam olhar além da simples comunicação entre os tibetanos. Eles saem do caminho que já está basicamente pronto na frente deles e olham para além do papel que preenchem.
Além disso, um Guru tem que ter a qualidade de saber não só da não dualidade, mas do estado natural, no qual ele acessa, ensina e age.
Para nós, é difícil, porque nós precisamos de tempo para entender o que quer dizer isso: que uma pessoa que tem uma realização e a capacidade de acessar sabedoria, neste caso, ainda poderia ter momentos ou tendências, que são comuns e é aí onde a pessoa erra.
Dizem que os mestres erram e não sabem de tudo, que em muitos momentos também eles não vão entender ou reagem com uma coisa por conta do apego ou com limitação. Como fazer então?
Se nós estamos decididos, se nós temos a motivação, a preparação para entrar no Vajrayana, o Dalai Lama recomenda observar um Guru por volta de 12 anos. Parece muita coisa, ficar observando, checando uma pessoa durante 12 anos. Mas, vejam bem a consequência: quando você confia numa pessoa que não tema realização, que se confunde, você vai gastar tempo, você vai ter uma relação muito imatura com uma pessoa que não é madura e o combustível para o seu amadurecimento espiritual não estará presente. Então isto, é uma catástrofe. Torna-se uma coisa muito difícil quando existe este erro.
Então, como observar um Guru? Nós precisamos ver se o que ele fala, o que ele faz depois, ver se tem uma coerência.
Depois, verificar como a pessoa age, se ela é acessível, se podemos ver se o que ela faz e fala é para o seu desenvolvimento espiritual ou se tem outros motivos.
Nós precisamos observar, ver e entender cada vez mais a pessoa.
O que não é confiável é a nossa fascinação. E isso acontece muito rápido se um professor tem muitos alunos, e os alunos o querem perfeito e vão exagerando, como por exemplo “ah, ele está lendo minha mente… a benção dele ou dela…”.
De forma rápida, se cria uma fantasia em volta de uma pessoa. Tem uma energia da devoção e isto não é muito confiável.
Nós precisamos também levar em consideração que ainda não sabemos como nos conectar com um professor, ou um líder espiritual e primeiramente nós vamos desejar um pai perfeito, uma mãe perfeita.
Teremos muitos momentos de imaturidade. De uma veneração de uma criança para um pai. E que não é uma relação ainda madura. Por outro lado, não tem como não passar por isso. Isso é o que aparecerá em nós e nós reagiremos desta maneira. Nós podemos ver isto quando o Guru não nos dá aquela atenção e ficamos um pouco chateados. Ou se o guru ficar um pouco mais rígido e nos criticar.
Quando ele nos trata como nós queremos ser tratados, nós achamos ele ou ela maravilhosos. Mas quando tem um outro comportamento, que deve ser necessário, de não só vivenciar apego na relação, nós ficamos chateados.
A tendência é que nós vamos criar uma pessoa bonita que nos dá muita atenção e que nunca nos critica. Isto é muito imaturo.
Nós precisamos por outro lado, observar se temos a sensação que este guru ou professor vai responder e que a resposta ressoa e dispara uma dinâmica, um desenvolvimento em nós e isto às vezes demora anos.
Muitos professores que conheço falam dos seus Gurus e que só depois de muito tempo enxergaram que, às vezes, pequenas frases tinham muito mais significado do que eles pensaram naquela época.
Além disso, nós precisamos amadurecer junto com o professor.
E voltando: se o professor não tem aquela realização, ele entra no papel e se nós, alunos, não sabemos claramente o que queremos, também entramos num papel, para receber atenção, para receber aprovação.
Mas, a ideia não é aprovação, a ideia é amadurecimento para que nossa consciência se libere.
Quando você fala para um Guru que quer ser seu aluno, ele vai reagir. Ele vai fazer alguma coisa. Muitas pessoas falam “ah, meu Lama, me falou, que eu deveria…” etc. Tem certeza de que ele acha que você é um aluno dele? Você tem certeza disto? E também prestar atenção que nenhum Guru vai agir, nos pegará, invasivamente e dirá: “olha eu vejo você nisso, isto é um erro, presta atenção naquilo, está tudo bem, agora você deveria fazer…”.
Talvez isso aconteça, talvez os professores sigam sua intuição. Mas, acredito que normalmente não aconteça. Você tem que perguntar, se uma coisa não está clara, se está estranha, vá até ele e esclareça.
Em relação aos professores: poucas pessoas entre nós têm tanta renúncia, tanta decisão e direcionamento para liberação que precisemos de um Guru.
É bem capaz que façamos parte de uma linhagem que tenha um Guru. E às vezes, tem orientações, às vezes tem contato com ele. Mas, a maior parte do trabalho é o trabalho de professores, que darão as primeiras orientações, as contemplações, para quem você tem mais tempo para conviver e vai ser para essas pessoas que você vai perguntar.
Daí primeiramente, nós precisamos nos direcionar para nossa liberação. Depois, o desenvolvimento de compaixão para todos os seres. Estes são os primeiros passos.
E você tem que ter o que em inglês poderíamos chamar de working basis. Que é uma base com o professor, onde você pode fazer este trabalho, onde você segue as instruções, com uma certa coerência, onde você pode tirar as dúvidas, onde o contato fica maior. Eu acredito que poucas pessoas entre nós já começam com um grande mestre. Muitas vezes, os mestres têm muitos alunos e eles não podem dar tanta atenção para explicar os ensinamentos básicos.
Então, veja sempre o que você quer desenvolver, o que você quer vivenciar e entenda quando você estiver tendo períodos mais imaturos, quando houver mais emoção, mais projeção, para você entender como você reage em relação ao Guru ou a alguém que lhe orienta.
Veja no seu coração. Você está pronto para ouvir tudo? Você quer que realmente ele ou ela fale tudo o que você precisa para o seu desenvolvimento?
Este é o ponto onde nós estamos: no momento de esclarecer, de perguntar, de compartilhar e entender pouco a pouco como se comunicar. Qual a informação que você precisa passar para ele e quais são as respostas que você vai querer receber. Você quer gentiliza ou você quer clareza? Às vezes tem os dois. Às vezes não. Tem que ver a qualidade do professor e ir colocando os ensinamentos em obra.
Transcrição do podcast Guru, do Lama Gelek, gravado em 26/07/2018.
Transcrição de Renata Sioufi. Revisão e adaptação feita por Elisabeth Medeiros em agosto de 2018.
Link para download da gravação original: https://www.dropbox.com/s/ht77f28f5l92fq6/%232_podcast_Guru_1_Gelek.mp3?dl=0